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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O MESTRE DO OCULTO (Prólogo I)

Aquele devia ser o mês de Agosto mais quente que a pequena vila de Bellavista vivera até agora. Não corria uma única brisa fresca, o que tornava o ar pesado e abafado mas isso não impedia Thomas Griffith de trabalhar.

Thomas considerava-se um cientista e dedicava-se de corpo e alma à investigação de fenómenos ocultos. Na Universidade olhavam-no com desconfiança por ter criado um departamento de Parapsicologia que, na opinião dos colegas, sugava fundos que poderiam muito bem ser redistribuídos pelos outros departamentos mais sérios. Tal como em qualquer outra universidade, também ali os recursos eram escassos por isso quando Thomas se lançou na criação daquele departamento, a iniciativa não foi bem aceite pelos colegas.

Em contra partida, a toda a história daquela vila era rica em fenómenos pouco normais que mereciam, na sua opinião, ser investigados e registados. Para tal, contava com a preciosa ajuda da sua colega e assistente, Sara Harding, que embora dotada de uma relutância e ceticismo aterradores, funcionava como uma espécie de elemento de contacto com a realidade impedindo-o de viver em exclusivo no seu mundo pejado de espíritos, fantasmas e demónios.

O ponteiro do grande relógio de parede aproximava-se perigosamente da meia-noite. Thomas tirou os óculos e esfregou os olhos. Estava a trabalhar num caso desde as oito horas da manhã e estava cansado, mas pelo menos o guião da entrevista estava pronto a ser utilizado. A cadeira rolou suavemente para trás graças e o professor levantou-se. Debruçou-se sobre o guião e com uma das hastes dos óculos na boca pensou que Sara não concordaria com algumas das abordagens propostas no documento. Por falar nisso, esta parecia demorar-se mais do que o habitual na biblioteca. Olhou novamente para o relógio. Os dois ponteiros juntaram-se nas doze horas. Subitamente, um zumbido invadiu-lhe os ouvidos e as luzes dos candeeiros de mesa tremeram. Num reflexo, as suas mãos taparam as orelhas e franziu a testa. Um arrepio de frio percorreu-lhe a espinha e uma aragem fresca invadiu a sala. Thomas caminhou até à janela, que se encontrava aberta, e fechou-a. Não querendo entrar por julgamentos antecipados, estranhou a súbita mudança de tempo. A meteorologia que ouvira de manhã pela rádio, não apontava para a descida de temperaturas e curiosamente, depois de ter fechado as janelas, a sala parecia estar ainda mais fria. Regressou à sua secretária e na primeira gaveta procurou o termómetro digital que usava para as medições da temperatura do ar. Enquanto remexia na gaveta, ouviu um ruído estranho que parecia vir dos corredores adjacentes. Largou a gaveta e já com o termómetro na mão aproximou-se da porta.


- Sara. És u? - Perguntou só para confirmar aquilo que já suspeitava. Não veio resposta.

Sara Harding estava empoleirada numa das estantes da biblioteca a arrumar os livros que havia requisitado quando, de repente, sentiu o ar vibrar pesadamente. Desceu cautelosamente, caminhou por entre as estantes até ao corredor principal e o seu olhar fixou-se na porta de entrada da biblioteca. O seu batimento cardíaco acelerou e o seu nível de alerta aumentou. “Thomas!” foi a única palavra que lhe veio à cabeça quando se lançou numa corrida desenfreada em direção ao escritório do professor.

Muito quieto no meio da sala com o termómetro na mão, Thomas podia sentir a presença de qualquer coisa. A temperatura estava agora nos zero graus e o zumbido, que inicialmente ouvira terminara mergulhando o escritório num silêncio perturbador. Era a primeira vez que vivenciava algo daquele género e apesar de já ter registado inúmeros casos de manifestações paranormais, a sua posição sempre tinha sido a do observador e nunca a da vítima. Inesperadamente, um som pesado assemelhando-se a alguém que bate furiosamente numa porta de madeira fê-lo saltar para trás, tornando-se cada vez mais forte à medida que percorria o corredor que conduzia à sua sala, mas ao encontrar a porta do escritório fechada parou. Thomas tentou controlar o seu medo através de um pequeno exercício de respiração. O princípio geral era o de que as entidades paranormais tinham como propósito universal assustar as suas vítimas, logo controlar o sentimento de medo tornava-se essencial para se poder lidar com elas. É claro que na maior parte das vezes, do dizer ao fazer e ao produzir algum tipo de efeito vai uma longa distância e naquela situação específica o efeito que esperava alcançar era francamente reduzido.


O puxador rodou lentamente.

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